Universal é condenada a indenizar pastor obrigado a fazer vasectomia
11 de setembro de 2020Pastor alegou ter sofrido abalo após passar pelo procedimento – Foto: Igreja Universal do Reino de Deus/Divulgação
A Justiça do Trabalho condenou a Igreja Universal do Reino de Deus a indenizar um pastor de Belo Horizonte que foi obrigado a passar por uma vasectomia e que transportava os valores dos dízimos em seu carro particular. Ele contou que sofreu abalo psíquico e emocional após a interferência da entidade na sua vida pessoal e agora vai receber a indenização por danos morais no valor de R$ 50 mil.
À Justiça, o pastor contou que foi obrigado a fazer o procedimento de vasectomia e a transportar frequentemente elevadas quantias de dinheiro em seu carro particular. A realização do procedimento foi confirmada por um exame médico e uma testemunha reforçou a denúncia sobre o transporte de valores, contando que, ao final de cada dia, ele levava o valor arrecadado na igreja para a matriz.
No depoimento pessoal, ele explicou que a igreja defende que todo pastor solteiro, antes do casamento, deve ser vasectomizado. No caso dele, o procedimento foi realizado em 2003, por um profissional do Rio Grande do Sul. Junto com ele, passaram pelo procedimento mais 30 pastores. Antes desse sistema de imposição, o pastor conta que muitos líderes da igreja tinham filhos.
Conduta indevida e excessos
Uma ação civil pública ajuizada na 43ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro também serviu como prova contra a entidade. A ação teve como objetivo condenar a igreja a abster-se imediatamente de exigir exames de vasectomia “a pastores, ministros, empregados ou obreiros que estejam sob a sua dependência jurídica ou hierárquica”.
Diante dos fatos, o juiz Marcos Vinícius Barroso, responsável pela sentença em BH, entendeu que a igreja praticou conduta indevida em relação aos seus colaboradores. “Aquele que exerce um direito, mas excede os fins sociais ou a boa-fé contratual, comete excessos, e fica responsável pela indenização. No caso, o excesso foi a interferência na vida pessoal do reclamante, que foi obrigado a fazer o procedimento de vasectomia e ainda transportar quantias de dinheiro em seu carro particular”, ressaltou o magistrado.
Segundo o juiz, vivenciar essa situação causou no pastor danos de caráter moral, como diminuição da estima, indignação pelo que viveu, perturbação da paz interior e sentimento de injustiça. Dessa forma, considerando o objetivo reparador e educativo das indenizações por danos morais, o porte da igreja e a situação vivenciada pelo pastor, o juiz fixou em R$ 50 mil o valor a ser pago.
Recurso
A igreja tentou recorrer, alegando que o direito de reivindicar a indenização estava prescrito, tendo em vista que o pastor relatou a realização da vasectomia em 2003. Mas, examinando o caso, julgadores da Primeira Turma do TRT-MG entenderam que, nesta situação, não se aplica a prescrição. ““O dano que sofreu o autor ao realizar a vasectomia é um dano de personalidade, sendo imprescritível como a doutrina e a jurisprudência nos ensinam”, ressaltou a desembargadora Maria Cecília Alves Pinto, relatora no processo.
Para a desembargadora, quando há alegação de submissão do trabalhador a estado de sujeição, como ocorre em casos de trabalho sujeito a condições análogas à de escravo, não se pode cogitar a aplicação da prescrição.
Após o julgamento no TRT-MG, o processo retornou à vara de origem para o exame de questões decorrentes do reconhecimento de relação de emprego entre as partes.
A reportagem procurou a Igreja Universal do Reino de Deus, mas, até a publicação desta reportagem, não obteve resposta. A matéria será atualizada tão logo a instituição se pronuncie.
Valedoitaúnas/Informações BHAZ