Pesquisa revela que 52% da população vê a saúde mental como o principal problema de saúde no país
13 de outubro de 2025Professores da Estácio apontam mudança cultural, sobrecarga social e a importância de fortalecer redes de cuidado emocional
Foto: Shvets/Pexels
Pela primeira vez, a saúde mental superou o câncer como a maior preocupação de saúde dos brasileiros. É o que mostra a pesquisa do Instituto Ipsos, divulgada no último dia 7 de outubro: 52% da população considera os transtornos mentais o principal desafio sanitário do país na atualidade.
O dado, que coincide com a semana do Dia Mundial da Saúde Mental (10 de outubro), reforça o alerta de profissionais e instituições sobre a necessidade de ampliar políticas públicas e redes de apoio emocional no Brasil.
Conscientização e quebra de estigmas
Para a professora e psicóloga Sátina Pimenta, coordenadora do curso de Psicologia no Centro Universitário Estácio de Vitória, o aumento da atenção à saúde mental não se deve apenas ao crescimento dos casos, mas também à diminuição da subnotificação e à maior conscientização da população sobre o tema. “Antes, as pessoas não queriam falar sobre saúde mental. Havia vergonha em se reconhecer nesse lugar de quem precisava de ajuda. Com a pandemia, isso mudou e agora passamos a nos ver como pessoas que podem e devem buscar apoio”, explica.
“Não é que todos estejamos mais doentes, mas hoje conseguimos reconhecer o adoecimento e falar sobre ele. Essa virada de chave é importante porque lidar com a realidade de forma consciente é o primeiro passo para enfrentá-la”, completa Sátina.
O professor Rafael Valêncio, coordenador de Psicologia na Estácio de Vila Velha, concorda e acrescenta que há uma mudança de paradigma no modo como a sociedade compreende o cuidado emocional. “Há 20 anos, ir ao psicólogo era sinônimo de loucura. Hoje, entendemos que o cuidado em saúde mental é parte do autocuidado. Ele não se restringe à terapia ou à medicação, ele envolve hábitos, relações, o corpo, a alimentação, o descanso. É um cuidado que a Organização Mundial da Saúde chama de biopsicossocial”, afirma.
Um mundo que cobra demais
O contexto contemporâneo é um fato primordial que pode sim estar favorecendo o adoecimento emocional. Para Sátina, isso pode ser explicado: “Vivemos em um mundo onde tudo se cobra, tudo se deseja, tudo se quer e nada é suficiente. As redes sociais e o mercado de trabalho alimentam uma lógica de exigência impossível de ser alcançada. Quando damos ‘tudo’ ao trabalho, tiramos algo de outro lugar, que pode ser da família, da saúde física, da mente. É um mundo do tudo que, no fim, nos deixa sem nada”, observa a especialista
Rafael Valêncio, coordenador de psicologia na Estácio de Vila Velha – Foto: Divulgação
Rafael Valêncio complementa que o ambiente profissional também demanda novas estratégias de cuidado. “O trabalho hoje invade nossas casas por meio do celular e das mensagens. O desafio é conseguir se desconectar, ter vida além do trabalho. Às vezes, cuidar da saúde mental é simplesmente permitir-se parar, estar com a família, ir à praia, ler um livro. São pequenos gestos que resgatam o equilíbrio e a conexão com o que somos”, destaca.
O papel das políticas públicas e da empatia nas relações
Sátina Pimenta é coordenadora d psicologia da Estácio Vitória – Foto: Divulgação
Para Sátina, o reconhecimento social do sofrimento é fundamental e passa tanto por políticas públicas quanto por atitudes individuais. “No Espírito Santo, temos bons exemplos de acolhimento na rede de atenção psicossocial, mas ainda há carência de acesso. A Estácio, por exemplo, tem cumprido um papel essencial nesse apoio. Só nos últimos três meses, nossos alunos receberam mais de 300 solicitações de atendimento psicológico. Isso mostra o tamanho da demanda e a importância da oferta gratuita e acessível”, afirma.
A professora também reforça a importância do respeito às limitações do outro. “Não cabe mais dizer que alguém está ‘de corpo mole’ porque tem ansiedade ou depressão. Precisamos respeitar a dor do outro, seja no trabalho, na escola ou nas relações afetivas. Esse olhar empático é parte do cuidado em saúde mental”, defende.
Ambos os especialistas concordam que não há fórmula única para o bem-estar emocional, porém há práticas e posturas que ajudam. “Não existe um manual com dez passos para produzir saúde mental”, afirma Rafael. “Cada pessoa tem seu modo de cuidar de si, mas é importante reconhecer o que nos faz bem e o que nos adoece. Às vezes, isso envolve mudar de ambiente, buscar terapia, ou simplesmente reservar tempo para o que nos dá prazer e sentido”, finaliza.
Sátina aproveita para fazer um pequeno lembrete para as pessoas: “Falar sobre saúde mental é fundamental, mas não basta. Precisamos agir e ampliar políticas públicas, promover ambientes de trabalho mais saudáveis, educar para o cuidado emocional. Cuidar da mente é cuidar da vida”.