Justiça autoriza interrupção de gravidez de criança estuprada em São Mateus, no Norte do ES
16 de agosto de 2020Menina de 10 anos, moradora do município de São Mateus, no Norte do estado, disse que era estuprada pelo tio desde os 6 anos. O agressor foi indiciado pela polícia, mas está foragido
Menina de dez anos engravida após ser estuprada no Espírito Santo – Foto: Divulgação
A Justiça do Espírito Santo determinou a interrupção imediata da gestação da menina de 10 anos que engravidou depois de ser estuprada por um tio, em São Mateus, na região Norte estado. A decisão, publicada nesta sexta-feira (14), atende um pedido do Ministério Público do Espírito Santo.
No documento, conseguido com exclusividade pelo ES2, da TV Gazeta, o juiz Antonio Moreira Fernandes determinou que "seja realizada a imediata análise médica quanto ao procedimento de melhor viabilidade para a preservação da vida da criança, seja pelo aborto ou interrupção da gestação por meio do parto imediato".
O crime foi descoberto na última sexta-feira (7), quando a menina, acompanhada de um familiar deu entrada no Hospital Roberto Silvares, em São Mateus. Ela informou ter sido estuprada pelo tio e estar com sintomas de gravidez. Um exame comprovou a gestação de aproximadamente 3 meses.
No hospital, ela relatou que sofria abusos sexuais do parente desde os 6 anos e que não tinha o denunciado porque ele a ameaçava. O suspeito do crime foi indiciado pela Polícia Civil pelos crimes de ameaça e estupro de vulnerável. Ele ainda não foi encontrado e é considerado foragido.
De acordo com a decisão, ao ser informado que a criança estava no hospital, o agressor esteve na casa da vítima. Por causa disso, a menina foi levada para um abrigo do município onde pudesse estar em segurança.
O juiz ainda cita na decisão que em um atendimento da Assistência Social com a criança, ao ser citada a gravidez, a menina "entra em profundo sofrimento, grita, chora e nega a todo instante, apenas reafirma não querer [...] levar a gravidez adiante".
De acordo com o Código Penal Brasileiro, de 1940, o aborto é permitido em três casos: gravidez decorrente de um estupro; risco à vida da gestante; e anencefalia do feto. Nos casos de gravidez decorrente de estupro, o procedimento pode ser feito até a 22ª semana de gravidez ou feto pesando até 500 gramas.
Pelo desejo da vítima em não manter a gestação, o magistrado conclui que a vontade da criança é soberana e não se deve dar seguimento a uma gravidez fruto de um ato de extrema violência.
A criança está sob a tutela do governo do Espírito Santo que a transferiu de São Mateus para Vitória.
O Ministério Público e o governo do estado estão decidindo em qual hospital será realizado o procedimento determinado pelo juiz.
Crime
O estupro chegou ao conhecimento da polícia no sábado (8), após a criança dar entrada no Hospital Roberto Silvares, em São Mateus, com sintomas de gravidez na sexta-feira (7).
A menina contou que era abusada desde os seis anos de idade por um tio e que não denunciou o crime porque era ameaçada por ele.
A gravidez, de cerca de três meses, foi confirmada por um exame de sangue.
Hospital Roberto Silvares, em São Mateus, no Espírito Santo – Foto: Frideberto Viega/ TV Gazeta
Suspeito foragido
O inquérito que investigava o caso foi concluído nesta quinta-feira (13). O suspeito já foi indiciado pelos crimes de ameaça e estupro de vulnerável, ambos praticados de forma continuada, mas ainda não foi encontrado. Um mandado de prisão preventiva contra ele foi expedido e o homem é considerado foragido.
Família
A secretária de Assistência Social de São Mateus contou que a família da criança era atendida por uma das unidades do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da Prefeitura de São Mateus.
Os familiares, segundo ela, eram participativos nas atividades e não davam indícios de “desestruturação”.
“Essa criança vivia em família extensa com os avós. Nossa equipe fazia o acompanhamento dessa família no CRAS, é uma família que participativa e era ativa nas atividades. A criança e a família nunca apresentaram algum indício desses abusos ou violações. Nossa equipe técnica ficou muito surpresa com o caso".
A secretária afirmou ainda que a criança já foi integrada na rotina do abrigo e já está em contato com as outras crianças que vivem no local.
Coletivos se manifestam
Desde que o caso se tornou público, no último sábado (8), o caso tem tomado repercussão. Antes da decisão da Justiça, uma nota pública divulgada na tarde desta sexta-feira (14) pela Frente pela Legalização do Aborto do Espírito Santo (FLAES) e assinada por vários outros grupos defende a prática do aborto nesse caso.
“Essa gestação é fruto de uma violência sexual gravíssima. A saúde da menina foi violada, tanto emocional, social e fisicamente. Será, uma violação ainda maior, se a interrupção dessa gestação não acontecer”, diz o documento.
TJES
Antes da decisão da Justiça, o TJES informou que a criança estava sendo devidamente assistida, recebendo todo o acompanhamento médico, psicológico e social que a ocasião demanda. Ela está em uma abrigo da prefeitura.
“Informações que não correspondem com a realidade têm influenciado a opinião de toda a sociedade, mas, pelo compromisso que este Juízo tem com o sigilo que resguarda o melhor interesse da criança, inclusive imposto legalmente, não serão revelados, em que pese eventual julgamento negativo e equivocado contra o Poder Judiciário. Neste momento, o direito à privacidade da criança e de sua família revela-se absoluto. Este é o compromisso do Poder Judiciário.", diz a nota do TJES.
OAB
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Espírito Santo (OAB-ES) também se posicionou sobre o caso neste sábado (15). Ele informou que a instituição está em contato com os advogados da família e que a OAB defende a interrupção da gravidez.
MPES
O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) também havia se manifestado por meio da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de São Mateus informando que "acompanha e atua desde o início no caso em tela visando a proteção, saúde e resguardo dos direitos da vítima sem se submeter a influências externas de qualquer natureza".
Defensoria Pública do ES
Antes da decisão, a Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES) disse que estava acompanhando o caso e analisando o processo e a adoção das medidas administrativas e judiciais necessárias para garantia dos direitos da criança, sua proteção, autonomia, saúde e preservação de sua imagem e identidade.
Valedoitaúnas/Informações G1