Inadimplência em beneficiários do Auxílio chega a 43%, e deve aumentar
20 de agosto de 2022Crédito consignado liberado para o benefício já tem juros de até 100%, alertam especialistas
Bolsonaro em entrega simbólica do cartão do Auxílio Brasil: valor de R$ 600 começa a ser pago na terça-feira (16) – Foto: Isac Nóbrega/PR
Cerca de 4 em cada dez eleitores (43%) que recebe o Auxílio Brasil está inadimplente, ou seja, deixou de pagar alguma conta no mês passado, enquanto 48% conseguiram manter as contas saneadas, aponta pesquisa PoderData. Entre os que não recebem o benefício, a inadimplência é um pouco maior, chegando a 48%. No grupo, 44% segue com as contas em dia.
A pesquisa foi realizada de 14 a 16 de agosto, sendo assim, já considera as parcelas 'turbinadas' do programa, no valor de R$ 600.
A série histórica mostra que a variação é estável e permanece dentro da margem de erro de 2 pontos percentuais. No último mês, 47% da população deixaram de pagar alguma conta. Outros 45% mantiveram os boletos em dia. Em maio o percentual era de 50% a 43%, respectivamente, bem como em janeiro.
Os dados sugerem, portanto, que os beneficiários pouco sentiram o efeito do programa assistencial no que diz respeito à quitação de débitos.
Crédito consignado deve impulsionar endividamento
Previsto para ser liberado em setembro, o crédito consignado para beneficiários do Auxílio Brasil deve impulsionar a margem de brasileiros endividados.
A União permitiu que bancos ofertem o empréstimo sem estipular teto para os juros e eximindo o governo de responsabilidade em caso de superendividamento.
Paola Loureiro Carvalho, assistente social e diretora de Relações Institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica, diz que a medida destoa do ideal de combate à miséria.
"As razões que atestam a crueldade dessa medida superam o âmbito econômico e atingem o plano ético. É consenso consolidado que do ponto de vista de política pública de combate à pobreza e aumento de bem-estar, o crédito em geral não deve ser prioridade", opina.
Segundo a especialista, o crédito consignado funciona quase como um programa de transferência de renda para o sistema financeiro, que se aproveita da situação de pobreza da população para aumentar os juros.
"Os consignados sequestram o caráter de proteção social dos benefícios ao entregar parte dos recursos ao sistema financeiro em prejuízo da dignidade dos beneficiários. Sequestra o direito de se viver o futuro com dignidade ao submeter famílias em situação de desespero, em decorrência da miséria, à armadilha do empréstimo", afirma.
"A própria lógica de funcionamento dos mercados de créditos, com suas estratégias de marketing, induzirá a população ao endividamento. Maximiza-se o lucro deliberadamente de maneira totalmente descolada do ponto de vista ético quando brasileiros, inclusive aqueles com limitados recursos socioemocionais em decorrência de insegurança alimentar/nutricional, tomam decisões alheias aos próprios interesses", completa.
Fernando Weigert, diretor da Neoconsig, diz que já existem bancos oferecendo empréstimo com juros anuais de quase 100% em algumas cidades.
Segundo as regras anunciadas pelo governo, o valor da renda que poderá ser comprometida pelos usuários do Auxílio Brasil será de 40%, sendo que até 35% poderá ser utilizado para o empréstimo pessoal e 5% poderá ser utilizado para saques e despesas do cartão de crédito consignado.
A pesquisa PoderData foi realizada de 14 a 16 de agosto de 2022. Foram entrevistadas 3.500 pessoas com 16 anos de idade ou mais em 322 municípios nas 27 unidades da Federação. Foi aplicada uma ponderação paramétrica para compensar desproporcionalidades nas variáveis de sexo, idade, grau de instrução, região e renda. A margem de erro é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos.
Valedoitaúnas (iG)