Em Portugal, uma viagem ao passado para atrair mão de obra no presente
15 de agosto de 2022Prefeito de Santa Maria da Feira espera que maior evento de recriação medieval da Europa ajude a revelar para os imigrantes a cidade, que convive com falta de trabalhadores
Santa Maria da Feira, norte de Portugal, durante a 25º Viagem Medieval Viagem Medieval/Divulgação
Santa Maria da Feira celebra o passado sem esquecer o presente. O prefeito Emídio Sousa espera que os 12 dias da 25ª Viagem Medieval, maior evento de recriação histórica do período na Europa, tenham despertado a curiosidade dos imigrantes e ajudem a atrair mão de obra para a cidade.
Município de 138 mil habitantes na área metropolitana do Porto, a Feira compete por trabalhadores com outras cidades nesta crise de mão de obra em Portugal. Sede de companhias nacionais e internacionais de atividades econômicas variadas, mantém zonas industriais e parques empresariais modernos. Um contraste com o castelo medieval, que pode ajudar a seduzir viajantes e futuros residentes.
“A Viagem Medieval é o momento para conhecer Santa Maria da Feira, município que está um bocadinho escondido. São 16 mil empresas, das quais três mil são indústrias. Há médico de família para todos, boas escolas públicas e privadas a preços acessíveis. Além de uma oferta cultural razoável. Tenho que fazer propaganda, mas venham ver se é verdade”, disse Sousa, do Partido Social Democrata (PSD), de centro-direita.
Milhares de pessoas participam da Viagem Medieval de Santa Maria da Feira – Foto: Viagem Medieval/Divulgação
O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras informa que eram 861 brasileiros no município em 2021. O aumento da comunidade foi visível durante a Viagem Medieval que aconteceu entre 3 a 14 de agosto, e o prefeito estima que sejam mais de mil este ano. Número insuficiente para as vagas que já sobram e outras que ainda serão abertas.
“Não há como precisar um número exato, mas posso dar exemplos. Só a Faurecia-Forvia (componentes para automóveis) tem 600 trabalhadores e vai aumentar para dois mil. E tem muitas outras. No calçado: somos os maiores produtores de calçados de luxo. E a mão de obra está a diminuir muito no momento em que é preciso transmitir o conhecimento do ofício antes que os mais experientes saiam do mercado. É preciso uma nova geração de trabalhadores, que não existe. Portanto, há oferta de emprego”, explicou o prefeito.
Antes de o festival começar, era comum encontrar avisos de vagas nos restaurantes. Ao lado da hotelaria e indústria, é um setor carente de trabalhadores na cidade.
“Hotelaria e gastronomia estão em situação absolutamente crítica. Há restaurantes e hotéis que não conseguem atingir a lotação máxima porque não têm gente para trabalhar. Alguns ponderam até fechar mais um dia da semana para dar descanso ao pessoal. Outro setor crítico é o da indústria”, disse Sousa.
Dançarina participa da Viagem Medieval em Santa Maria da Feira – Foto: Viagem Medieval/Divulgação
A lacuna de mão de obra começa a afetar o serviço público, segundo o prefeito:
“Na construção civil é dramático. Abrimos na prefeitura um concurso para obras e não aparece ninguém para fazer. E nós pagamos bem. Pagamos por hora e em dez dias. E não vêm. Eu questiono as empresas, que respondem: Não temos mão de obra".
Sousa conta que mantém em seu gabinete uma equipe voltada para facilitar a imigração. Mas pede maior envolvimento do Estado e dos empresários.
“Tem que haver um programa de vistos mais simples e que envolva os empresários. Que pessoas precisam, que competências elas devem ter? Mas os empresários têm que assegurar habitação digna aos imigrantes ao menos nos primeiros dois anos. Estão dispostos a fazer isso e algumas empresas já fazem. É isso que faz de Portugal um país interessante para quem quer trabalhar” explicou.
Espetáculo de reconstrução histórica na Viagem Medieval de Santa Maria da Feira – Foto: Viagem Medieval/Divulgação
O problema da habitação corre em paralelo com a falta de mão de obra. O prefeito revelou que a cidade corre o risco de ficar sem imóveis para receber novos residentes.
“Começa a faltar habitação. Como há necessidade de trabalhadores, muitos se deslocam de outras cidades para cá e faltam imóveis. Qualquer construtora que começa um projeto vende o prédio ainda na planta. Portanto, o território está com essa dinâmica.
Após a pandemia de Covid-19, o prefeito notou um movimento de empresas internacionais em direção a Portugal. Mas a escassez de funcionários é obstáculo ao investimento”, afirmou:
“A Europa percebeu, com a pandemia, que não pode depender muito da Ásia e começou um movimento de realocar as indústrias em solo europeu. Neste aspecto, Portugal é um país privilegiado por estar perto do mar, ter uma sociedade não conflituosa e ser um país seguro. Recebo quase todos meses projetos de investimento internacional, mas falta mão de obra”, finalizou.
O prefeito Emídio de Sousa, ao centro, durante encenação no castelo de Santa Maria da Feira – Foto: Viagem Medieval/Divulgação
Valedoitaúnas ( O GLOBO)