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Começam escavações em antigo convento irlandês que abriga restos mortais de 796 crianças

16 de julho de 2025

Arqueólogos iniciam operação inédita para recuperar os restos de quase 800 crianças enterradas sem registro por freiras

Começam escavações em antigo convento irlandês que abriga restos mortais de 796 criançasIrmãs de antigo convento enterram 796 crianças, sem qualquer tipo de documentação – Foto: Auguste Blanqui/Creative Commons

Começou nesta semana, em Tuam, no Condado de Galway, na Irlanda, uma escavação sem precedentes para recuperar os restos mortais de quase 800 crianças enterradas em vala comum, sem identificação, no antigo Lar Materno-Infantil St. Mary’s, gerido pela ordem religiosa Bon Secours.

A operação, que deve durar dois anos, visa dar dignidade póstuma às vítimas da negligência institucional em uma das passagens mais obscuras da relação entre Igreja e Estado no país.

Entre 1925 e 1961, o St. Mary’s abrigava mães solteiras e seus filhos – ambos estigmatizados pela sociedade da época. Segundo registros oficiais, 796 crianças morreram na instituição, mas só duas foram sepultadas em cemitério.

O restante teria sido enterrado secretamente em uma antiga fossa séptica, sem qualquer memorial ou documentação.

O caso só veio à tona em 2014, após a pesquisa incansável da historiadora local Catherine Corless. Movida por memórias de infância e exclusão escolar das chamadas “crianças do lar”, ela descobriu certidões de óbito ignoradas por décadas.

Com a repercussão de sua denúncia, o governo irlandês reconheceu a tragédia, pediu desculpas públicas e criou uma comissão de inquérito. Agora, a promessa de escavação começa a se cumprir.

Sítio arqueológico forense

A área, hoje ocupada por um conjunto habitacional, tornou-se um sítio arqueológico forense. A operação é liderada por Daniel MacSweeney, com equipe de 18 especialistas vindos de países como Irlanda, Reino Unido, Austrália, Colômbia, Espanha e EUA.

A escavação segue protocolos rigorosos de cena de crime, dada a possibilidade de mortes não naturais. Amostras de DNA estão sendo coletadas de familiares para tentar identificar as vítimas.

As primeiras escavações feitas entre 2016 e 2017 revelaram 20 câmaras com restos humanos – misturados, frágeis e desorganizados.

Agora, a missão é reunir essas peças dispersas, dar nome aos pequenos corpos e permitir que sejam enterrados com respeito, algo negado em vida.

Preço da operação

A operação custeada pelo governo, com orçamento entre 6 e 13 milhões de euros (R$ 39 milhões a R$ 85 milhões), representa também um acerto de contas com a própria identidade nacional.

Durante décadas, instituições religiosas como a de Tuam operaram com aval do Estado, sob uma moral repressiva que associava sexualidade fora do casamento à vergonha. Segundo relatório oficial divulgado em 2021, mais de 9.000 crianças morreram em 18 lares do tipo.

O trabalho agora é técnico, mas também simbólico. “Nosso objetivo é restaurar a dignidade”, afirmou MacSweeney.

“Esses corpos estão em um local completamente inadequado. Enterrá-los com respeito é o mínimo que podemos fazer”, continua.

Além do local principal, o hospital Grove – também administrado pelas freiras Bon Secours – passará a ser monitorado por arqueólogos, diante de suspeitas de novos enterramentos clandestinos.

Com a escavação em curso e um filme sobre o caso, coproduzido por Liam Neeson, prestes a ser filmado, a Irlanda encara o desafio de nomear seus fantasmas e enterrar, com a devida reverência, uma dor que por muito tempo ficou oculta sob o concreto e o silêncio.

(Fonte: R7)



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