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Bolsonaro diz que Barroso e Moraes extrapolam limites constitucionais e pedirá abertura de processo ao Senado

14 de agosto de 2021

Declaração vem após derrota do voto impresso e prisão de Roberto Jefferson. Bolsonaro fala em prisão arbitrária e quer apuração sobre ministros. Juristas criticam postura do presidente

Bolsonaro diz que Barroso e Moraes extrapolam limites constitucionais e pedirá abertura de processo ao SenadoBolsonaro durante assinatura da MP do etanol em 11 de agosto de 2021 – Foto: Isac Nobrega/PR

O presidente Jair Bolsonaro afirmou neste sábado (14), em publicações nas redes sociais, que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Luis Roberto Barroso e Alexandre de Moraes extrapolam "com atos os limites constitucionais" e disse que pedirá ao presidente do Senado, Rodrigo Pachco (DEM-MG), a abertura de um processo para investigar os dois.

Procurado pela TV Globo, o presidente do Senado não se manifestou até a última atualização desta reportagem.

Bolsonaro viajou a Resende (RJ), onde participou de uma cerimônia na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), neste sábado (14). Pela manhã, ele deixou o hotel de trânsito do Exército no qual está hospedado, conversou com apoiadores e foi para BR-116 (Dutra) para acenar para motoristas.

Bolsonaro diz que Barroso e Moraes extrapolam limites constitucionais e pedirá abertura de processo ao SenadoBolsonaro acena para motorista na beira de rodovia em Resende – Foto: Reprodução

Bolsonaro afirmou ainda que não provoca e não deseja uma ruptura institucional e que "todos sabem" quais seriam as consequências disso.

Ele disse que na próxima semana pedirá ao presidente do Senado que instaure um processo sobre ambos, "de acordo com o art. 52 da Constituição Federal".

O dispositivo constitucional citado pelo presidente diz que "compete privativamente ao Senado Federal" processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal em casos de crime de responsabilidade.

Este dispositivo é comumente usado por cidadãos e autoridades para embasar juridicamente pedidos de impeachment contra ministros do STF, que nunca prosperaram.

O Senado tem, pelo menos, dez pedidos de impeachment contra ministros do Supremo protocolados. Seis miram Alexandre de Moraes. Um, inclusive, foi protocolado por Roberto Jefferson. Nenhum, no entanto, prosperou.

O professor de direito constitucional da Universidade Federal Fluminense Gustavo Sampaio disse que nunca houve, na história da República, um impeachment de ministro do STF e que ainda não existe jurisprudência formada sobre a matéria.

"O presidente está dizendo que ele pode pedir a decretação do impeachment de um ministro do Supremo Tribunal Federal. Isso, a rigor, é até possível, mas quem decide é o Senado Federal, e não o presidente", afirmou.

A fala do presidente vem na esteira da derrota do voto impresso na Câmara dos Deputados e da prisão do aliado Roberto Jeferson, presidente nacional do PTB.

Na terça-feira (10), em uma derrota para Bolsonaro, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que previa a impressão de votos em eleições, plebiscitos e referendos não alcançou o número de votos necessários para ser aprovada e acabou arquivada pelos deputados.

Bolsonaro acusa Barroso, presidente do Tribuna Superior Eleitoral (TSE) e defensor das urnas eletrônicas, de interferir nos debates no Legislativo sobre o tema. O presidente chegou a ameaçar, em mais de uma ocasião, com a não realização das eleições em 2022.

Análise de juristas

A advogada constitucionalista e mestre em direito público administrativo pela FGV Vera Chemim afirmou que ministros do Supremo poderiam ser processados se violassem a Constituição, o que para ela não ocorreu.

"Com relação ao ministro Barroso é completamente descabido o pedido de impeachment. Não há nada que possa levar ao pedido de impeachment. Ele é presidente do TSE e colocou sua posição e da instituição", disse. "Sobre o Moraes, o ato da prisão em si é legal, porque o Roberto Jefferson vem há algum tempo já adotando uma conduta no sentido de dirigir graves atos de ofensa a determinados ministros do STF", afirmou.

A professora de direito comparado da USP Maristela Basso disse que Bolsonaro não pode pedir impeachment de ministros do STF simplesmente por discordar de decisões judiciais. Para ela, no entanto, o presidente atua fora do que diz a lei e inaugurou uma "Constituição interna".

"Ele [Bolsonaro] já se acostumou. Faz o que ele acha que deve fazer, no momento em que ele deseja e vamos em frente assim. Agora é uma disputa pessoal dele com os presidente dos outros poderes", afirmou. "Estamos vivendo uma cena no qual o presidente faz o que ele bem entende. Criou uma Constituição interna que ele acha que segue, uma cena paralela" acrescentou a professora.

Para o advogado criminalista Pierpaolo Bottini, Barroso e Moraes não cometeram crime de responsabilidade. Bolsonaro tem o direito de criticar decisões, porém não pode atacar as instituições.

"Os ministros decidiram, exerceram a sua jurisdição. A decisão, mais uma vez, pode desagradar o presidente da República, ele tem o direito de criticar essa decisão, mas o que ele não pode evidentemente é atacar a instituição. Isso é fundamental pra preservação da estabilidade institucional, que cada um jogue dentro das regras do jogo", disse.

Após ser incluído no inquérito das fake news, Bolsonaro também ameaçou agir fora da Constituição. O presidente já é alvo de quatro inquéritos no Supremo Tribunal Federal e um no Tribunal Superior Elitoral.

Em outra frente, no Legislativo, o presidente já é alvo de mais de 120 pedidos de impeachment protocolados na Câmara.

Milícia digital

Aliado de primeira hora, Jefferson foi preso nesta sexta-feira (13) dentro do inquérito investiga milícias digitais e tramita no STF. A autorização para a prisão partiu do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.

Na série de postagens publicadas neste sábado, Bolsonaro não citou o aliado, mas disse: "o povo brasileiro não aceitará passivamente que direitos e garantias fundamentais, como o da liberdade de expressão, continuem a ser violados e punidos com prisões arbitrárias, justamente por quem deveria defendê-los".

Ele ainda cobrou Moraes por uma fala durante a sabatina do ministro no Senado, que precedeu a posse dele no STF. O presidente transcreveu uma declaração do ministro ao senadores, na qual disse: "reafirmo minha independência, meu compromisso com a Constituição, e minha devoção com as liberdades individuais".

O inquérito que investiga a organização e o funcionamento de uma milícia digital voltada a ataques à democracia foi aberto em julho, por decisão de Moraes.

Nessa investigação, a PF apura indícios e provas que apontam para a existência de uma organização criminosa que teria agido com a finalidade de atentar contra o Estado democrático de direito.

Essa organização se dividiria em núcleos: de produção, de publicação, de financiamento e político. Outra suspeita é de que o grupo tenha sido abastecido com verba pública.

Roberto Jefferson

Ex-deputado, Roberto Jefferson foi o pivô do escândalo do mensalão, em 2005. Foi a partir de uma entrevista dele ao jornal "Folha de S. Paulo" que o país tomou conhecimento das denúncias de que o governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva passava dinheiro a deputados da base.

Em novembro de 2012, no julgamento do mensalão no STF, ele foi condenado a 7 anos e 14 dias de prisão, pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva.

Nos últimos anos, já sem mandato parlamentar, Jefferson se aproximou do presidente Jair Bolsonaro. Em suas redes sociais, começou a postar fotos com armas. O armamento da população é uma das principais causas do presidente.

Valedoitaúnas (G1)



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